Há muito tempo, havia um menino de dois ou três anos que muitas vezes, sem quê nem porquê, precisava de mimo. E queria-o sempre da mesma maneira. Eu tinha de largar os livros por onde estava a estudar, pôr “aquela” canção a tocar no gira-discos – tinha de ser Tammy – agarrar-lhe ao colo, deixá-lo encostar a cabeça no meu ombro de adolescente e embalá-lo enquanto o abraçava com muita, muita força.Ainda agora, quando ouço estes sons, sinto a cabecinha dele escondida no meu pescoço e os braços de criança nos meus ombros.
Muitos anos depois reencontrei a canção. Mas o homem em que o menino se tornara esquecera “Tammy”, esquecera que tinha precisado de mimo e que eu lho dera. E as notas da canção não lhe trouxeram nenhuma reminiscência.
Apesar disso, neste momento, por dentro de mim, trauteio Tammy como quem murmura uma canção de embalar. E peço ao menino que durma, que se deixe dormir, suavemente, e que nesse adormecer haja ao menos um nadinha do meu embalo. Ao menos um som ao longe, vindo de um passado que há tanto tempo deixou de existir.

